Compreendendo o TDAH: tudo o que você precisa saber sobre o Déficit de Atenção

TDAH

O Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) é um transtorno do neurodesenvolvimento que afeta crianças e adultos. Sua principal característica é um padrão contínuo de desatenção e/ou hiperatividade/impulsividade que causa impactos na rotina da pessoa.

Neste post, farei uma discussão completa com você, mostrando o que é o TDAH, como ele é avaliado em psicologia, os diferentes tipos de TDAH, o papel da medicação e da psicoterapia no tratamento, os problemas psicológicos associados ao TDAH, comportamentos comuns que passam despercebidos e quando procurar psicoterapia.

O texto vai estar recheado de exemplos práticos e informações úteis, então leia com atenção!

O que é TDAH?

O Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH), também conhecido como Transtorno do Déficit de Atenção (DDA), é um distúrbio do neurodesenvolvimento que afeta a capacidade do indivíduo de regular sua atenção e impulsos. Isso significa que os indivíduos com TDAH podem ter dificuldade em se concentrar em tarefas, manter-se organizado, administrar o tempo e controlar suas vontades.

O TDAH geralmente é diagnosticado na infância. Apesar disso, com a popularização desse transtorno — hoje é uma trend bastante famosa no TikTok, por exemplo — o diagnóstico tardio, em adultos, também se tornou bastante comum.

Não atoa hoje em dia encontrarmos obras como “Vencendo o TDAH Adulto: Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade“, escrito por Barkley e Benton, fazem tanto sucesso.

Quais são os principais sintomas do TDAH?

Os sintomas do TDAH podem ser classificados em três categorias: desatenção, hiperatividade e impulsividade. Eles podem ser entendidos da seguinte forma:

Desatenção

A desatenção é caracterizada por uma dificuldade em se concentrar nas tarefas, esquecimento e desorganização

As pessoas com TDAH podem ter problemas para prestar atenção aos detalhes, manter a atenção e muitas vezes tendem a cometer erros por descuido. Elas também apresentam dificuldade em se manterem organizadas, seguir instruções e concluir tarefas. 

Alguns exemplos da desatenção são:

  • Dificuldade em prestar atenção aos detalhes: pessoas com TDAH muitas vezes cometem erros por descuido, uma vez que detalhes tendem a passar despercebidos por elas.
    • Exemplo: não raramente, pessoas com TDAH erram questões em provas não por falta de conhecimento, mas por deixarem de notar palavras nos enunciados, como “exceto”. O mesmo acontece com informações importantes de projetos no trabalho.
  • Dificuldade em manter a atenção: a dificuldade de sustentar a atenção tende a aparecer em comportamentos de esquiva, como troca frequente de tarefas ou distração fácil.
    • Exemplo: durante a execução de uma tarefa importante, mesmo se esforçando para focar, alguém com TDAH pode se pegar fazendo outra tarefa mais “interessante”, ou mexendo nas redes sociais e procrastinando.
  • Esquecimento: pessoas com TDAH podem lutar contra o esquecimento, como esquecer compromissos, prazos ou tarefas importantes. Isso acontece tanto pelo prejuízo na memória quanto porque para haver memória é necessário que antes haja atenção na informação que precisa ser “guardada”.
    • Exemplo: algumas pessoas com TDAH tendem a esquecer de pagar contas, perdem prazos importantes de entrega e às vezes são “surpreendidas” em sala de aula com a apresentação de algum trabalho que elas não se lembravam que precisava ser feito.
  • Dificuldade de organização: manter o espaço de trabalho organizado ou gerenciar a agenda, sabendo priorizar tarefas, podem ser grandes desafios para quem sofre com TDAH.
    • Exemplo: a pessoa pode se planejar para fazer as atividades do dia dentro do tempo que tem disponível, mas mesmo assim chega no período noturno e percebe que não conseguiu concluir o planejamento, seja por calcular errado o tempo que seria gasto ou por se perder na ordem das tarefas a serem feitas.

Hiperatividade

A hiperatividade refere-se a atividades feitas excessivamente, sejam elas motoras ou mentais, como inquietação, dificuldade para descansar, excesso de pensamentos intrusivos durante a execução de atividades e grande esforço para ficar parado. 

Pessoas com TDAH podem sentir uma necessidade constante de se mover, falar excessivamente ou lidar com vários pensamentos simultaneamente, dificultando o foco em uma única tarefa.

Alguns exemplos relativamente comuns de hiperatividade são:

  • Inquietação: a inquietação pode se manifestar em diversos comportamentos, como ficar tocando os dedos das mãos ou mexendo a perna para baixo e para cima, contorcer-se na cadeira ou levantar-se e andar com frequência.
    • Exemplo: durante uma reunião ou aula, alguém com TDAH pode ter dificuldade em ficar parado e pode se mexer constantemente na cadeira, ficar batendo os pés, girando a caneta, olhando para os lados, riscando o caderno etc.
  • Falar excessivamente: outro sintoma de hiperatividade no TDAH é a fala excessiva. Pessoas com TDAH podem ter dificuldade de autorregulação, levando-as a interromper conversas ou falar por cima dos outros.
    • Exemplo: alguém com TDAH pode se esforçar para se revezar em uma conversa em grupo e, mesmo assim, pode frequentemente interromper ou falar por cima dos outros. É um “impulso quase incontrolável” em alguns casos.
  • Dificuldade com atividades silenciosas: as pessoas com TDAH podem achar difícil se envolver em atividades silenciosas, especialmente aquelas que exijam ficar paradas por um longo período. Isso tende a levar a uma necessidade constante de movimento.
    • Exemplo: alguém com TDAH pode ter dificuldade para assistir a um filme ou ler um livro sem se levantar com frequência ou se envolver em outras atividades simultaneamente.
  • Estar sempre “on the go”:  outra característica comum experienciada por pessoas com TDAH é a frequente necessidade de estar em movimento, o que dificulta o relaxamento, o descanso e a desaceleração.
    • Exemplo: alguém com TDAH pode se esforçar para ficar quieto e relaxar nos fins de semana, mas ao fazer isso tende a se sentir inquieto até que se envolva em alguma atividade.

Impulsividade

Impulsividade é um traço comportamental que tem como característica a dificuldade em inibir ou controlar o comportamento, como interromper os outros, dificuldade em esperar e tomada de decisão impulsiva.

As pessoas com TDAH podem agir sem pensar, têm dificuldade em esperar sua vez e apresentam prejuízo no autocontrole — para entender melhor esse último ponto, vá até a parte que explico sobre “funções executivas e TDAH”.

Deixo aqui alguns exemplos da impulsividade nesse transtorno do neurodesenvolvimento:

  • Discurso impulsivo: falar impulsivamente, como interromper os outros, deixar escapar pensamentos ou ideias ou falar sem pensar primeiro são algumas marcas da impulsividade no TDAH.
    • Exemplo: alguém com TDAH pode falar fora de hora em uma reunião ou interromper alguém no meio de uma frase.
  • Ações impulsivas: outro sintoma de impulsividade são as ações impulsivas, como agir sem considerar as consequências ou correr riscos.
    • Exemplo: alguém com TDAH pode se envolver em comportamentos de risco, como gastos excessivos, abuso de substâncias, sexo sem proteção ou direção perigosa.
  • Dificuldade em controlar os impulsos: pessoas com TDAH apresentam dificuldade em controlar, inibir ou postergar a reação a impulsos, como dificuldade em esperar sua vez ou controlar suas respostas emocionais.
    • Exemplo: alguém com TDAH pode ter dificuldade em esperar na fila, ficar facilmente frustrado, apresentar baixo controle da sua raiva ou não conseguir “esconder” um momento de tristeza, chorando publicamente.
  • Falta de planejamento: outra dificuldade relativamente comum nesse transtorno é a falta de premeditação e dificuldade para se planejar, o que pode levar à impulsividade.
    • Exemplo: alguém com TDAH pode iniciar um projeto sem considerar todas as etapas envolvidas, levando a erros ou trabalhos incompletos.

É importante observar que nem todos com TDAH apresentam todos esses três sintomas. Algumas pessoas com TDAH podem experimentar principalmente desatenção, enquanto outras podem ter sintomas de hiperatividade ou impulsividade mais proeminentes.

Somado a isso, preciso dizer que todas as pessoas experimentam todos esses sintomas em algum momento da vida, mas para quem tem TDAH esses sintomas acontecem em grau e frequência altos o suficiente para gerar um impacto significativo em seu funcionamento diário e em sua qualidade de vida.

Quais são os critérios para diagnosticar o TDAH?

Quando você procura um psicólogo, psiquiatra ou neurologista para fazer uma avaliação, esses profissionais se baseiam na lista de critérios diagnósticos trazidos pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5).

Esse manual traz uma série de critérios que precisam ser preenchidos para que alguém possa realmente ser diagnosticado com TDAH. Eles são divididos em 5 pontos, A, B, C, D e E. Além disso, o critério A é um pouco mais extenso, por isso vou dividir a explicação em duas partes.

Critério A para o diagnóstico de TDAH

A primeira característica que o DSM-5 traz para ser avaliada é o padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade-impulsividade — sim, avaliamos impulsividade e hiperatividade juntos, já que tendem a ser complementares.

Durante essa avaliação precisamos estar atentos se os sintomas interferem na vida da pessoa e tiveram impacto ao longo de seu desenvolvimento.

1. Desatenção

Para que seja identificado um nível de desatenção que cumpra com os critérios do diagnóstico, é necessário que a pessoa apresente seis ou mais sintomas, por pelo menos seis meses e com impacto negativo, especificamente em atividades profissionais, acadêmicas e sociais. 

Para que você possa ver como essa avaliação é feita, tomei a liberdade de retirar todos os sintomas diretamente do DSM-5. São eles:

a. Frequentemente não presta atenção em detalhes ou comete erros por descuido em tarefas escolares, no trabalho ou durante outras atividades (p. ex., negligência ou deixa passar detalhes, o trabalho é impreciso).

b. Frequentemente tem dificuldade de manter a atenção em tarefas ou atividades lúdicas (p. ex., dificuldade de manter o foco durante aulas, conversas ou leituras prolongadas).

c. Frequentemente parece não escutar quando alguém lhe dirige a palavra diretamente (p. ex., parece estar com a cabeça longe, mesmo na ausência de qualquer distração óbvia).

d. Frequentemente não segue instruções até o fim e não consegue terminar trabalhos escolares, tarefas ou deveres no local de trabalho (p. ex., começa as tarefas, mas rapidamente perde o foco e facilmente perde o rumo).

e. Frequentemente tem dificuldade para organizar tarefas e atividades (p. ex., dificuldade em gerenciar tarefas sequenciais; dificuldade em manter materiais e objetos pessoais em ordem; trabalho desorganizado e desleixado; mau gerenciamento do tempo; dificuldade em cumprir prazos).

f. Frequentemente evita, não gosta ou reluta em se envolver em tarefas que exijam esforço mental prolongado (p. ex., trabalhos escolares ou lições de casa; para adolescentes mais velhos e adultos, preparo de relatórios, preenchimento de formulários, revisão de trabalhos longos). 

g. Frequentemente perde coisas necessárias para tarefas ou atividades (p. ex., materiais escolares, lápis, livros, instrumentos, carteiras, chaves, documentos, óculos, celular).

h. Com frequência é facilmente distraído por estímulos externos (para adolescentes mais velhos e adultos, pode incluir pensamentos não relacionados).

i. Com frequência é esquecido em relação a atividades cotidianas (p. ex., realizar tarefas, obrigações; para adolescentes mais velhos e adultos, retornar ligações, pagar contas, manter horários agendados).

Fonte: American Psychiatric Association (APA). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.

2. Hiperatividade-impulsividade

Os critérios para avaliar hiperatividade e impulsividade são semelhantes aos de desatenção: pelo menos seis sintomas, com persistência de pelo menos seis meses e que causem algum grau de prejuízo em atividades acadêmicas, profissionais e sociais.

Também retirei os próximos sintomas diretamente do DSM-5, são eles:

a. Frequentemente remexe ou batuca as mãos ou os pés ou se contorce na cadeira.

b. Frequentemente levanta da cadeira em situações em que se espera que permaneça sentado (p. ex., sai do seu lugar em sala de aula, no escritório ou em outro local de trabalho ou em outras situações que exijam que se permaneça em um mesmo lugar).

c. Frequentemente corre ou sobe nas coisas em situações em que isso é inapropriado. (Nota: Em adolescentes ou adultos, pode se limitar a sensações de inquietude.)

d. Com frequência é incapaz de brincar ou se envolver em atividades de lazer calmamente. 

e. Com frequência “não para”, agindo como se estivesse “com o motor ligado” (p. ex., não consegue ou se sente desconfortável em ficar parado por muito tempo, como em restaurantes, reuniões; outros podem ver o indivíduo como inquieto ou difícil de acompanhar). 

f. Frequentemente fala demais.

g. Frequentemente deixa escapar uma resposta antes que a pergunta tenha sido concluída (p. ex., termina frases dos outros, não consegue aguardar a vez de falar).

h. Frequentemente tem dificuldade para esperar a sua vez (p. ex., aguardar em uma fila).

i. Frequentemente interrompe ou se intromete (p. ex., mete-se nas conversas, jogos ou atividades; pode começar a usar as coisas de outras pessoas sem pedir ou receber permissão; para adolescentes e adultos, pode intrometer-se em ou assumir o controle sobre o que outros estão fazendo).

Fonte: American Psychiatric Association (APA). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.

Demais critérios para o diagnóstico de TDAH

Após avaliar os padrões de desatenção, hiperatividade e impulsividade, vem a segunda parte da análise que precede o diagnóstico de Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade. Em outras palavras: não adianta só ter ter 6 sintomas de desatenção e 6 sintomas de hiperatividade-impulsividade, ainda é preciso cumprir outros critérios.

Vou mostrar como cada um deles aparece no DSM-5 e em seguida explicarei o que significam. São eles:

B. Vários sintomas de desatenção ou hiperatividade-impulsividade estavam presentes antes dos 12 anos de idade.

Lembra que no início do texto falei que o TDAH era um transtorno do neurodesenvolvimento? Pois bem, neurodesenvolvimento é um processo pelo qual nosso cérebro passa durante a gestação, infância e adolescência.

Nesse processo o cérebro se desenvolve para criar circuitos neurais que são responsáveis por diversas funções cognitivas e motoras. 

Como o TDAH tem um prejuízo justamente nesse desenvolvimento, os sintomas do transtorno precisam estar presentes antes dos 12 anos. Caso contrário, o diagnóstico não será de TDAH e o profissional precisará encontrar outra causa para a desatenção, hiperatividade e impulsividade.

C. Vários sintomas de desatenção ou hiperatividade-impulsividade estão presentes em dois ou mais ambientes (p. ex., em casa, na escola, no trabalho; com amigos ou parentes; em outras atividades).

Outro ponto importante para o diagnóstico do TDAH é que os sintomas apareçam em mais de dois ambientes. A lógica aqui é bastante direta: uma vez que o transtorno é caracterizado por um prejuízo em algumas funções do cérebro, nada mais natural que isso acabe afetando diferentes esferas da vida da pessoa.

Caso os sintomas acontemçam apenas em ambientes específicos, é bem provável que o diagnóstico não seja de TDAH. Por exemplo: se a desatenção e a hiperatividade acontecem apenas no trabalho, talvez seja um caso de Burnout. Caso aconteça apenas quando a pessoa está na rua, talvez tenha alguma relação com a ansiedade (Síndrome do Pânico, por exemplo).

D. Há evidências claras de que os sintomas interferem no funcionamento social, acadêmico ou profissional ou de que reduzem sua qualidade.

Se a desatenção, a hiperatividade e a impulsividade geram prejuízos ou reduzem a qualidade do desempenho da pessoa na escola/faculdade, no trabalho ou na relação com outras pessoas, então temos um caso de TDAH. Caso contrário, não.

Apesar de parecer simples, esse tópico é um pouco complicado por um detalhe: a queda no desempenho precisa estar diretamente relacionada com os sintomas. Isso só é possível de ser avaliado individualmente, durante uma consulta.

E. Os sintomas não ocorrem exclusivamente durante o curso de esquizofrenia ou outro transtorno psicótico e não são mais bem explicados por outro transtorno mental (p. ex., transtorno do humor, transtorno de ansiedade, transtorno dissociativo, transtorno da personalidade, intoxicação ou abstinência de substância).

Por fim, mas não menos importante, temos um critério de exclusão. O item E dos critérios diagnósticos chama a atenção para o fato de que os sintomas só podem servir de base diagnóstica para o TDAH caso não sejam melhor explicados por outras questões clínicas.

Além dos transtornos citados (esquizofrenia, transtorno psicótico, do humor, de ansiedade, dissociativo etc.), atualmente também é recomendado avaliar: tempo de exposição em telas, rotina, qualidade da alimentação, sono e prática de exercícios.

Isso acontece porque qualquer um desses itens pode fazer com que os sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade apareçam. 

A diferença é que para alguém com sono mal regulado basta que a qualidade do sono melhore e os sintomas “desaparecem”, por exemplo. Já no caso do TDAH não, uma vez que ele é um transtorno que precisa de acompanhamento e o tratamento acontece no longo prazo.

Funções executivas e TDAH

Até agora falei sobre os sintomas do TDAH, como se manifestam e a maneira como avaliamos uma pessoa que chega no consultório com essa demanda. Mas… o que é que realmente causa esses sintomas?

Até agora só trouxe uma causa: os sintomas aparecem por conta de um problema durante o neurodesenvolvimento. A questão é: que área do neurodesenvolvimento é afetada e gera os sintomas de desatenção, impulsividade e hiperatividade?

Já adianto a resposta: pessoas com TDAH tem um prejuízo em uma coisa chamada “funções executivas”.

O que são Funções executivas?

Funções executivas é o nome dado para um conjunto de processos cognitivos (as formas como nosso cérebro lida com as informações do mundo) responsáveis por gerenciar e regular nosso comportamento, pensamentos e emoções.

Essas funções nos permitem planejar, organizar, priorizar, iniciar, sustentar e ajustar nosso comportamento em resposta a situações de mudança e são essenciais para o comportamento direcionado a objetivos, resolução de problemas, tomada de decisões e interação social.

Desse modo, podemos dizer que as funções executivas são as “ferramentas” que nosso cérebro utiliza para captar as informações do mundo (escutar algum som, por exemplo), interpretá-las (identificar o som e perceber que são palavras) e responder a elas (entender o que foi dito e pensar em uma forma de continuar o diálogo).

Alguns exemplos de funções executivas são:

  • Controle inibitório: capacidade de se “impedir” de realizar comportamentos inadequados ou impulsivos (evitar comer o chocolate que está em cima da mesa, por exemplo);
  • Memória de trabalho: capacidade de manter e reter informações temporariamente na mente enquanto uma tarefa é feita (como digitar uma senha);
  • Planejamento e organização: capacidade de definir objetivos e desenvolver um plano para alcançá-las;
  • Iniciação da tarefa: capacidade de iniciar uma tarefa sem ajuda externa (como começar a estudar sem que alguém precise chamar a atenção);
  • Gerenciamento de tempo: capacidade de estimar com certa precisão o tempo necessário para concluir uma tarefa e gerenciar o tempo de forma eficaz;
  • Regulação emocional: capacidade de regular e gerenciar as próprias emoções (controlar um ataque de raiva, por exemplo);
  • Automonitoramento: capacidade de monitorar o próprio desempenho e fazer ajustes conforme necessário;
  • Controle atencional: capacidade de focar e manter a atenção em uma tarefa ou objetivo, apesar das distrações ou estímulos competitivos (ler um livro mesmo com o excesso de barulhos ao redor, por exemplo).

Qual é a relação das funções executivas e o TDAH?

No contexto do TDAH, existe um prejuízo nas funções executivas. Olhando para a lista acima você provavelmente já identificou que a baixa eficiência de algumas dessas “ferramentas mentais” fazem com que os sintomas do transtorno apareçam.

No final das contas, é exatamente isso. O prejuízo no funcionamento executivo leva a pessoa a ter dificuldades para se planejar, organizar, gerir o tempo e concluir tarefas.

Uma pessoa com TDAH normalmente precisa se esforçar muito para priorizar tarefas, iniciar um projeto, manter sua atenção e regular suas emoções quando confrontada com uma tarefa desafiadora ou chata.

É importante que eu chame atenção para o caráter individual dos transtornos mentais aqui. Mesmo que uma pessoa seja diagnosticada com TDAH, isso não significa que ela terá prejuízo em todas as funções executivas e nem que o grau de prejuízo será o mesmo para cada função.

Existe uma grande variabilidade nos sintomas do TDAH, sem contar que déficit nas funções executivas também está presente em vários outros transtornos e condições.

Como é feita a avaliação do TDAH?

A avaliação do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade pode ser feita por três profissionais: neurologista, psiquiatra e psicólogo.

Grande parte do processo de avaliação é feito por meio de consultas (sim, precisa ser mais do que uma consulta, afinal de contas é uma avaliação). Durante os encontros o profissional vai coletar dados sobre a vida da pessoa, entendendo onde os sintomas aparecem, com que frequência, a quanto tempo e qual o grau de prejuízo para a rotina e a qualidade das atividades feitas.

Ao longo das consultas o profissional utilizará principalmente três instrumentos de avaliação: questionários, escalas de classificação e entrevistas estruturadas.

Caso necessário, o profissional ainda pode solicitar uma avaliação psicológica/neuropsicológica para confirmar o diagnóstico. Elas são, basicamente, uma bateria de exames psicológicos que vão medir diferentes aspectos do comportamento e das funções executivas do avaliando.

Ao final desse processo o profissional responsável fará seu diagnóstico e te explicará sobre o tratamento — mas pode ficar tranquilo que falaremos sobre isso neste texto também!

Quais tipos de TDAH existem?

Existem diferentes tipos e graus do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade. Durante o processo de diagnóstico isso também é avaliado para que a pessoa tenha o melhor tratamento possível, indo de acordo com as especificidades do transtorno dela.

Os subtipos de TDAH são divididos em:

  • combinado (ou misto): quando tanto os critérios de Desatenção quanto os de Hiperatividade-Impulsividade são preenchidos;
  • predominantemente desatento: quando os critérios da Desatenção são preenchidos, mas os da Hiperatividade-Impulsividade não;
  • predominantemente impulsivo/hiperativo: quando os critérios de Hiperatividade-Impulsividade são preenchidos, mas os de Desatenção não.

Além disso, também temos três diferentes graus de TDAH. São eles:

  • Leve: quando poucos sintomas estão presentes no comportamento do paciente além do mínimo necessário para o diagnóstico (6 sintomas), e os sintomas geram apenas pequenos prejuízos no funcionamento social e profissional;
  • Moderado: quando tanto os sintomas quanto os prejuízos estão entre “leve” e “grave”;
  • Grave: quando o paciente apresenta vários sintomas além dos necessários para o diagnóstico, ou apresenta sintomas especialmente graves, ou no caso de sintomas que resultam em grande prejuízo no funcionamento social ou profissional.

O TDAH pode ser curado com medicamentos?

Primeiro a notícia que talvez te desaponte: não existe cura para o TDAH. Ele é uma condição que ocorre em função do desenvolvimento do cérebro da pessoa. Algumas funções executivas podem ser treinadas para reduzir os sintomas, mas TDAH é para a vida toda.

Por outro lado,a medicação pode ser uma opção de tratamento eficaz. Medicamentos como estimulantes (a Ritalina, por exemplo) e não estimulantes (antidepressivos e ansiolíticos) ajudam a aumentar os níveis de certos neurotransmissores no cérebro, o que pode melhorar a atenção e reduzir a impulsividade.

O principal medicamento utilizado no tratamento do TDAH é o metilfenidato (conhecido pelo medicamento referência, a Ritalina). Em outros países a atomoxetina também tem se mostrado uma opção para o tratamento, ajudando a reduzir a desatenção e o comportamento impulsivo, mas no Brasil ainda é difícil ter acesso a ela.

Que problemas psicológicos alguém com TDAH pode ter além do próprio TDAH?

Na área da saúde existe um conceito bastante importante: comorbidade. Essa palavra existe para descrever cenários no qual uma ou mais doenças, transtornos, síndromes ou condições estão associadas a outras.

Pessoas com TDAH são, infelizmente, um bom exemplo disso. Elas têm um risco maior de desenvolverem comorbidades que vão além dos sintomas do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade.

Algumas das comorbidades mais comuns são:

  • Transtornos de ansiedade (Transtorno de Ansiedade Generalizada, Fobia Social, Síndrome do Pânico, Estresse Pós-traumático etc.);
  • Transtornos do humor (Depressão, Transtorno Afetivo Bipolar, Ciclotimia, Distimia);
  • Transtornos por uso de substâncias;
  • Transtorno de conduta;
  • Dificuldades de aprendizagem;
  • Problemas de sono.

Quais comportamentos são comuns para pessoas com TDAH que muitas vezes passam despercebidos?

Quando um profissional da saúde, eu incluso, fala sobre sintomas de determinado transtorno ou doença, normalmente as explicações acabam ficando um pouco teóricas demais.

Por isso, vou tentar traduzir alguns dos sintomas que descrevi até agora de um jeito um pouco mais prático. Assim você poderá identificar melhor esses detalhes na sua vida.

Baixa autoestima

Quem vive com TDAH enfrenta vários desafios ao longo do seu dia, desde completar tarefas rotineiras, como fazer o almoço, até entregas importantes, como elaborar um relatório ou ser aprovado em uma avaliação acadêmica.

O esquecimento, desorganização e procrastinação podem gerar consequências negativas para a vida da pessoa, colocando em xeque suas próprias competências e impactando diretamente na autoestima.

Crianças com TDAH, por exemplo, podem receber vários feedbacks negativos de professores, colegas e membros da família sobre seu comportamento. 

Palavras como “preguiçoso”, “bagunceiro”, “intransigente”, “sem interesse” e “sem dedicação” podem sair da boca dessas pessoas para nomear comportamentos que na verdade são apenas sintomas do TDAH ainda não diagnosticado.

Em adultos a situação não é diferente e os desafios são os mesmos, mas agora na faculdade, relacionamento amoroso ou no mercado de trabalho.

Ao ser submetido a esses ambientes invalidades constantemente, a pessoa com TDAH pode ter a constante sensação de estar falhando, sente que não consegue atingir as expectativas dos outros e consequentemente sente vergonha, culpa e inadequação.

Mais especificamente em adultos, outros impactos negativos também podem acontecer: sentimento de não ser capaz de ter uma boa performance, constantes comparações negativas com colegas de trabalho e amigos e pensamentos sobre inferioridade e baixa autovalorização.

Dificuldade com o gerenciamento do tempo

TDAH e gestão de tempo é realmente uma relação complicada. Por isso, a pontualidade tende a ser um problema, o que acarreta em atrasos relativamente frequentes.

Uma pessoa com TDAH pode, por exemplo, perder o controle do tempo e a noção das horas enquanto está envolvida em uma tarefa que gosta ou acha interessante. É o clássico “só vou ver mais um vídeo” e se passam duas horas com o olho grudado no Tiktok.

Isso faz com que os prazos importantes sejam perdidos ou que a pessoa se atrase para reuniões, mesmo com o despertador ligado, com avisos no celular ou post-its colados na tela do computador para lembrá-la.

Tomada de decisão impulsiva

Sabe aquela história de impulsividade? Pois é, a falta do controle inibitório (uma das funções executivas que falamos) faz uma diferença imensa na vida de quem tem TDAH.

Pessoas com esse transtorno costumam ser reativas ao ambiente. Isso significa que elas normalmente reagem aos estímulos que surgem, seja algum pensamento ou algo que apareceu próximo a ela.

Uma pessoa com TDAH não tratado poderia facilmente entrar em uma loja, ver algo que ela queira e decidir comprar na hora, independentemente de ter ou não dinheiro para arcar com essa compra depois.

Comportamentos de risco

Além das compras, a impulsividade gera alguns outros “efeitos colaterais”, que são os chamados comportamentos de risco, que são aquelas ações feitas de maneira não muito pensada e que tem uma chance de gerar grandes perdas.

Alguns exemplos desse comportamento são: consumo excessivo de drogas (incluindo álcool), sexo sem proteção, direção acima da velocidade permitida, participação em esportes “radicais” sem o devido cuidado etc.

Dificuldade em seguir planos ou compromissos

Outra área afetada pelo Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade é o planejamento (ou organização). Essa função executiva é a responsável por nos ajudar a criar e seguir processos.

Quem tem TDAH apresenta um prejuízo no planejamento, o que leva a cenas como:

  • combinar de sair com os amigos, mas se aproximando do horário “descobre” que para chegar até o local precisa pegar um ônibus, então decide desmarcar;
  • ao cozinhar, pula etapas, como temperar o alimento, descongelar a comida algumas horas antes do preparo etc.;
  • começa a fazer um trabalho acadêmico, foca nas partes que são mais interessantes e após entregar para a professora receber a notícia de que está incompleto.

Dificuldade em regular emoções ou responder adequadamente a sinais sociais

A união entre baixa habilidade de regulação emocional + baixo controle inibitório pode ser catastrófica em alguns cenários sociais.

Alguém com a carência dessas duas funções cognitivas pode lidar com a seguinte situação: em uma reunião com o chefe escuta algo sobre seu trabalho, fica insatisfeito e não consegue impedir que o choro aconteça.

Ou, para dar um exemplo ainda mais extremo: durante uma conversa com amigos escuta algo que não gosta. Isso gera sentimentos de raiva, e, antes que a pessoa consiga processar esse sentimento, “estoura”, xingando ou atacando diretamente a pessoa que fez o comentário.

Tendência a procrastinar ou adiar o início das tarefas até o último minuto

A desatenção do TDAH não acontece em 100% do tempo. Na verdade, pessoas com esse transtorno conseguem, sim, níveis elevados de concentração em duas situações: quando gostam e tem interesse pelo que estão fazendo e quando algo é urgente.

Ao se deparar com a tarefa de escrever um texto, quem tem TDAH pode facilmente deixar a página que irá escrever aberta e ficar mexendo nas redes sociais, jogando, andando pela casa, tudo isso sem digitar uma única palavra por dias a fio. Ou, quando muito, cria algumas marcações, mas logo perde o interesse.

Esse comportamento dura até o momento que o prazo de entrega chega. Ao atingir o limite de tempo, a pessoa com TDAH se vê em um nível de estresse muito alto, o que leva ela a focar na tarefa e entregá-la.

Assim, o texto que poderia ter sido escrito ao longo de uma semana fica pronto da noite para o dia. Claro que a qualidade da entrega é mais baixa do que poderia ser, a pessoa abre mão de horas de sono e ainda precisa lidar com um estresse imenso durante a tarefa.

Uma pessoa com TDAH pode ter uma vida “normal” e saudável?

Embora o TDAH possa apresentar desafios em muitas áreas da vida, como vimos até aqui, com o tratamento e suporte corretos os indivíduos com TDAH podem levar uma vida saudável.

O tratamento para o TDAH geralmente inclui uma combinação de medicamentos, psicoterapia e mudanças no estilo de vida. Além disso, existe também a possibilidade de treinar as funções cognitivas prejudicadas pelo transtorno, melhorando significativamente o funcionamento delas mesmo sem a medicação.

A psicoterapia pode ajudar a desenvolver estratégias de enfrentamento, melhorar habilidades sociais e gerenciar condições concomitantes, como ansiedade ou depressão. Mudanças no estilo de vida, como exercícios regulares, dieta saudável e sono adequado, também são fundamentais.

Sem um sono de qualidade, por exemplo, o sistema atencional da pessoa fica ainda mais prejudicado, acentuando os sintomas do TDAH.

Quando uma pessoa com TDAH deve procurar psicoterapia?

Embora a medicação possa ser útil no controle dos sintomas do TDAH, a psicoterapia é essencial para fornecer suporte e habilidades adicionais para lidar com os desafios de viver com o TDAH.

Algumas das áreas que a psicoterapia poderia ajudar alguém com esse quadro clínico são:

  • Dificuldade com gerenciamento e organização do tempo

Durante a psicoterapia, a pessoa com TDAH vai aprender noções básicas e estratégias de gestão de tempo, priorização de tarefas e criação de processos (dividir tarefas grandes em tarefas menores e mais adequadas à execução);

  • Dificuldade com habilidades sociais

A psicoterapia leva em consideração o prejuízo que o TDAH gera no relacionamento social de quem sofre com o transtorno. Assim, o psicólogo ajudará o paciente a desenvolver habilidades sociais, ensinando a ele sobre como captar pistas (para onde olhar, como olhar, como responder em determinadas situações) e a se expressar melhor (como pensar antes de falar, por exemplo) 

  • Condições concomitantes

Como vimos, o TDAH às vezes é acompanhado por outras condições, como Transtornos de Ansiedade, Depressão, dificuldade de aprendizado etc. Essas diversas condições também são tratadas durante a psicoterapia.

Nesse caso, o psicólogo normalmente trabalhará em duas vertentes: primeiro ajudará a controlar os sintomas, para trazer um alívio mais rápido para o paciente. Depois fará um treinamento de longo prazo para que a pessoa com TDAH aprenda a lidar sozinha com cada uma das condições, sem depender do psicólogo para sempre.

  • Luta com a autoestima 

Uma parte significativa da psicoterapia para pessoas com TDAH tem relação com o ganho de algumas habilidades, como habilidades sociais, gestão de tempo, controle de estímulos (para reduzir a desatenção) etc.

O conjunto dessas novas habilidades permite ao indivíduo com TDAH perceber não só que ele é competente e consegue concluir tarefas e socializar de maneira saudável, mas também produz reconhecimento por esse desenvolvimento.

Somado a isso, durante a psicoterapia o psicólogo usa algumas estratégias específicas para ajudar a pessoa a aumentar sua percepção de autovalor e realmente entender seus pontos fortes, habilidades e qualidades.

Dessa forma, a psicoterapia ajuda a pessoa com TDAH a desenvolver a autoestima internamente, ao perceber seus pontos positivos, e externamente, ao receber o reconhecimento das outras pessoas.

  • Dificuldade em lidar com o estresse

O excesso de pensamentos, a motricidade acelerada, a dificuldade de atenção e os constantes esquecimentos tendem a levar pessoas com TDAH a picos elevados de estresse e ansiedade. Juntando isso com a baixa habilidade de regular esses estados internos já dá para imaginar o problema, concorda?

Na psicoterapia existem treinos específicos voltados para a regulação emocional que vão justamente auxiliar a pessoa com TDAH a lidar com esses estados internos.

Em outras palavras, a psicoterapia é uma base que pode oferecer a quem tem TDAH uma oportunidade para desenvolver uma série de habilidades que farão toda a diferença no trabalho, escola e nos relacionamentos sociais.

Olha, o TDAH não é uma sentença de morte e muito menos algo que tem o potencial de prejudicar sua vida profundamente. Desde que seja tratado e você tenha profissionais competentes ao seu redor, é completamente possível viver uma vida plena e saudável com o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade.

Caso você tenha se identificado com os sintomas que falamos ao longo do conteúdo ou queira uma orientação a mais sobre esse transtorno, pode me chamar. Minhas consultas são 100% online e você pode entrar em contato comigo clicando aqui.

SOBRE O AUTOR: Sou um psicólogo (CRP 04/51810) dedicado a ajudar pessoas a desbloquearem seu potencial máximo e alcançarem o sucesso em suas vidas. Minha missão é clara: eliminar as barreiras que impedem você de prosperar. Entendo que a jornada do desenvolvimento pessoal pode ser complexa, e é por isso que minha abordagem é sempre empática e flexível. Acredito que cada pessoa é única, com sua própria história, desafios e objetivos. Você não será rotulado aqui; em vez disso, exploraremos juntos o que está por trás de suas ações, pensamentos e aspirações. Com mais de 7 anos de experiência, estou comprometido em fornecer resultados tangíveis. Trabalho com abordagens baseadas em evidências, sempre considerando o contexto individual. Quer dar um passo em direção a uma vida mais plena e completa? Clique aqui e agende sua primeira consulta comigo!

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